Fragmentos de mim: A mudança

quinta-feira, 28 de novembro de 2013

A mudança

E eis que já me preparo para mais uma mudança de casa... É, esse é um dos males de não se possuir casa própria. Por outro lado, temo que um dia, não precise mudar mais, pois apesar do estresse que toda mudança acarreta, é muito legal respirar novos ares, mesmo que seja na mesma cidade ou, no meu caso, no mesmo condomínio.
No entanto,  o que me leva a produzir esse texto não é a mudança em si, mas a recordação de um fato inusitado, cômico e por que não, de certa forma traumático, que norteou uma dessas minhas mudanças... Eu estava à procura de uma casa, e uma amiga me acompanhava nessa procura. Na época, ela pretendia que dividíssemos despesas, o que para mim, era uma alternativa interessante. Além de boa companhia, diminuiria um pouco minhas despesas. O fato é que encontramos uma casa perfeita: bem localizada, valor de aluguel acessível e próximo ao meu trabalho.
Mas que triste! a casa não poderia ser alugada, afinal a proprietária resolvera reformá-la, dado o estado deplorável em que esta se encontrava. Sem contar nos inúmeros assaltos e péssima vizinhança que teríamos. Bem, que sorte. Não alugamos, é claro.
Tamanha foi a revolta, no dia seguinte, quando descobrimos que uma amiga nossa alugou a dita casa e que ela estava em perfeito estado de conservação. Mas, como??? Nossa colega havia ido ver a casa, na companhia do marido, o que, de pronto, fez com que a proprietária a alugasse com maior prazer e num valor mais acessível ainda.
Não, a casa não precisava de reformas. O problema era eu. Ou melhor, o problema era proprietária achar que minha amiga e eu formávamos um casal. Qual revolta foi a minha ao descobrir isso!? Eu? gay?? Como assim???
Fui ferida na alma com isso e confesso que, apesar de respeitar e amar de coração meus vários amigos homossexuais,  minha revolta inicial esteve relacionada ao fato de eu ser julgada por algo que acredito, até agora, não ser. Nunca me havia passado pela cabeça ser homossexual e, muito menos, como é cruel a rejeição a que se submete uma pessoa por isso. Rapidamente, minha ira aumentou. Afinal, se eu fosse homossexual eu não teria, segundo essa mulher, o direito à moradia? Quer dizer, então, que meu dinheiro, fruto de meu trabalho honesto, não teria valor algum caso minha aptidão sexual não fosse a que a proprietária da casa quisesse ou achasse aceitável?
O fato é que esse episódio me modificou. Rende, ainda hoje, muitas gargalhadas e brincadeiras entre amigos, sempre com um fundo de respeito e reflexão acerca de até onde vai o nosso direito de julgar o outro. Sei que ao falar em respeito, também preciso - todos necessitamos - respeitar toda e qualquer forma de pensar, por mais estranha e pernóstica que pareça, inclusive as posturas que repelimos. Afinal, cada um tem o direito de pensar como achar conveniente a si e de acordo com seus valores e formação moral, cultural e blá blá blá. Mas, mesmo assim, não me conformo.
Mesmo depois dos trinta, eu ainda queria mudar o mundo.
Hoje, respeito mais. Por alguns instantes, pus-me na pele dos meus amigos homossexuais, ou melhor, fui colocada na pele deles. Graças a isso, pude provar um pouco mais do preconceito e intolerância humanos que vivem a buscar um motivo para excluir, banir alguém do seio de pessoas perfeitas do mundo, por algum motivo. Já não bastava ser rotulada como deficiente por não ser como a maioria, que possui o rosto de uma única cor, também me senti um pouco gay. De alguma forma, acho que precisava viver isso. Se não precisava, vivi do mesmo jeito e essa experiência fez-me diferente a partir de então.
Elaborei, graças a isso, uma teoria: Devo buscar me conhecer mais e melhor, bem como respeitar cada tipo de pensar, inclusive os preconceituosos e excludentes; Chego a uma conclusão: deve ser tanta intolerância que faz as pessoas serem tão doentes. Talvez seja por falta de autoconhecimento ou mesmo, por não aceitarem aquilo que descobrem sobre si mesmas, que algumas pessoas se tornam tão infelizes e amargas.
É interessante como as pessoas tendem a destilar nos outros toda a intolerância que carregam sobre si mesmas. É estratégia de sobrevivência, eu entendo.
O fato é que a natureza é perfeita e não nos permite olhar em nossos próprios olhos sem o auxílio de um espelho. E graças a isso, muitos sobrevivem procrastinando o momento de se colocarem cara a cara, diante do espelho da subjetividade. Estaria aí o motivo de tantas depressões?

4 comentários:

  1. Parabéns !!! Ótimo texto e ótima lição ! :)

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    1. OBRIGADA, QUERIDA TELMA. SAUDADES DE VOCÊ.
      BEIJO IMENSO E MUITA LUZ.

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  2. O preconceito vai acabando com o mundo aos poucos.Ótimo texto!!

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    1. É verdade, Andressa. E as pessoas que são assim não se reconhecem como preconceituosas, mas como sábias, donas da verdade, detentoras de todas as qualidades. Lamentável.
      Obrigada pela leitura, querida.

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