Fragmentos de mim: novembro 2018

quarta-feira, 28 de novembro de 2018

Liberdade

O amor e a vida precisam ser uma gaiola de portas abertas. Liberdade é a palavra-chave que abre todas as portas da própria consciência e do próprio coração. Passamos a vida inteira em busca de liberdade e o fato é que, quando nos deparamos com ela, percebemos que o que queríamos, de repente, não era liberdade, era só ego.
Nessa busca ilusória, visamos à liberdade para escolher, para decidir ir ou vir, quem fica e quem sai. Somos o centro de tudo. Nós decidimos. Isso é o nosso sonho imaturo de ser livre. No entanto, Liberdade mesmo é muito mais, pois não existe sem a responsabilidade e o compromisso com as próprias emoções e, mais ainda, com o dever de aceitar que o outro tem o mesmo direito que nós. No exercício dessa liberdade de escolher, muita coisa e muita gente vai ter que ficar de lado. Somos limitados demais para ter tudo. É egoísta demais querer ser importante para alguém só porque a pessoa é importante para nós. Porque os outros, no exercício de seu direito de escolha podem (e muitas vezes, vão) nos deixar de lado.
Escolher morar em uma cidade implica sair de outra; Muitas vezes, não vai dar para conciliar mais de um emprego ou função. Muitos amores nunca serão correspondidos e tudo isso é um pouco de nossa liberdade de sermos quem somos e de os outros serem quem são, de o mundo ser o que ele é. 
Liberdade para escolher, maturidade para arcar com as consequências das escolhas; Liberdade para amar, risco de nunca ser amado; Assumir responsabilidades, abrir mão de um sonho. Nossa alma é um poço infinito de sensações, sentimentos e segredos que, por mais que o mundo nunca conheça, nos definem em cada detalhe mais profundo de quem somos. 
Viver é uma aventura incrível! É preciso muita disposição para tudo isso; é necessário, é vital que essa disposição exista. Deixar abertas as portas das gaiolas da alma é muito mais doloroso do que pode parecer, mas também é nobre e maduro. E o mundo não precisa e, na maioria das vezes, nunca vai poder (nem deve) conhecer a extensão e profundidade disso para o nosso coração. Podemos estar sorrindo enquanto nossa alma sangra, porque os sonhos que acalentamos com tanto carinho talvez nunca se realizem, porque as pessoas que mais gostaríamos de ter por perto talvez só queiram descansar de nós, porque alguns enigmas só podem ser compartilhados entre nós e Deus.
Pode soar caótico, mas tudo isso são passos para frente. Tudo isso é liberdade.

sexta-feira, 16 de novembro de 2018

Procura teu lugar, menina!

"Transcenda o ordinário. Renuncie ao extraordinário. Seja você mesmo(a): atreva-se a viver sua singularidade - ser original, ocupar "seu lugar" no "concerto das coisas", descobrindo o propósito de sua existência. Os seres sub-humanos (animais e vegetais) o sabem.

Benjamin Teixeira de Aguiar pelo espírito Temístocles.

Eis que no dia hoje cai uma chuvinha leve e descompromissada, como uma mensagem dos céus de que as minhas angústias serão levadas, minha alma será lavada e encontrará um aconchego de paz, que talvez signifique encontrar o meu lugar. Passei toda a infância e boa parte da vida adulta ouvindo e reproduzindo a frase do título: "procura teu lugar". Nem sempre com menção exclamativa, é claro. Em boa parte dos casos, a frase fazia parte de conselhos. Mas a questão de hoje é: o que isso significa?
Por razões que hoje eu não teria coragem de admitir para ninguém, acordei querendo ser outra pessoa, ou pior, eu acalentei no coração a vontade de que determinada pessoa não existisse... Percebi, depois, que o fato de essa pessoa existir ou não, não modificaria as coisas que ocorrem comigo. Eu me desloquei do meu lugar e está sendo doloroso reencontrar o caminho de volta. Entretanto, estou certa de que será preciso sangrar na abertura desse caminho, antes que eu sangre desesperada e inutilmente por não ter feito isso quando deveria.
Procurar nosso lugar no mundo talvez tenha a ver com viver realmente a própria vida, saboreando cada experiência única de aprender sem se colocar em comparação com os outros. Perdemos tanta energia lamentando o que não conquistamos, chorando o amor que não vivemos, a família que não construímos, o relacionamento que não conseguimos salvar, a paixão não correspondida, a casa não comprada, a viagem que não foi feita, o dinheiro que deixamos de poupar ou de ganhar (ihhh, a lista é infinita) que deixamos de valorizar o que conseguimos. Negligenciamos nossas qualidades. Somos cruéis com nós mesmos.
Na ânsia de sermos tão felizes como o outro - que por sinal nem sabemos se é feliz mesmo - deixamos de vivenciar e de valorizar nossas próprias lutas, nossas próprias conquistas. É preciso transcender, ir além de si mesmo, mas isso não significa querer ser o centro de tudo. Ser discreto é ser sábio. "Ah, mas isso pode significar nada para os outros". O que importa? Não é para os outros que tem que significar, é para nós mesmos. 
Nunca estamos satisfeitos. Isso é fato e nem sempre é ruim. É necessário querer mais, buscar sempre. No entanto, isso perde a validade se transformado em motivo de lamentação. As inquietações precisam ser molas propulsoras para frente, não motivos de autoflagelação. 
"Ah, mas eu perdi um ente querido..." Você estava feliz vendo essa pessoa sofrer? No mais, quem nunca perdeu alguém que atire a primeira pedra... "Não estou feliz na minha carreira profissional". Tem feito o que para mudar isso? "Não sou amado(a) como gostaria por determinada pessoa". Toda forma de amor é válida. Preferia nada? Ora, ora... deixemos de birra! Quem não consegue ser um bom amigo(a) não seria um bom companheiro(a).
Às vezes, procurar o nosso lugar pode nos quebrar inteiros por dentro...
Bancar o chateado(a), no entanto, não mudará as coisas, apenas garantirá uma rota de infelicidade gratuita e falta de aproveitamento da melhor maneira daquilo que a vida nos tem proporcionado, tantas e tantas vezes, tão além do que fazemos por merecer. Procura teu lugar no mundo e se isso te faz perceber que quebrou a cara... bem, junta os cacos e monta novo. Lembra que não pode jogar fora nenhum pedacinho, pois seria o mesmo que jogar a si mesmo(a) na lata de lixo. Junta tudo! Junta tudo e monta de novo e, de repente, você descobre que pode ser um quebra-cabeça bem divertido. Pode ser que seja preciso mais cola do que o normal, mas o importante é que será a sua melhor versão de todos os tempos.

segunda-feira, 12 de novembro de 2018

É só um pouco de tristeza

Temos uma percepção equivocada acerca de nós mesmos. Achamo-nos mais ou menos importantes do que somos, mais ou menos certos do que realmente estamos, mais ou menos inteligentes do que realmente somos e por aí vai...
Viver é uma busca constante por equilíbrio e essa conquista está, de alguma maneira relacionada àquilo que somos em relação a nós mesmos e aos outros. Há quem se diga feliz sozinho(a), há quem não queira se aceitar ou aceitar as coisas como estão, há quem não queira, em hipótese alguma, estar só... Tudo isso, a meu ver, diz pouco se não estamos conectados ao nosso próprio eixo, se desconhecemos quem somos e o que realmente nos faria felizes. (Refiro-me ao mais profundo de nós mesmos e não ao que esperam que sejamos ou façamos). O fato é que temos limites e precisamos admitir isso, primeiro para nós mesmos, depois para os outros.
É tão comum se ouvir falar em depressão, tristeza, insatisfação, frustração. O problema não é isso. O problema é que apesar disso, continuamos não sabendo lidar com a coisa quando ela nos atinge. E ninguém, absolutamente ninguém, está imune à tristeza. Não falo de uma tristeza qualquer, falo de TRISTEZA! Assim, com todas as letras maiúsculas. 
Sem querer, a gente perde o interesse de se arrumar, perde a vontade de sair de casa, já não importa mais se a casa está bagunçada ou se a roupa é a mesma da semana passada. Imperceptivelmente, tomar banho e usar algo mais arrumandinho se transforma em um sacrifício medonhho e as tarefas do dia a dia representam uma odisseia praticamente insuperável. 
Sobreviver com isso cercado de pessoas que não enxergam a dor é afundar numa solidão que palavra alguma consegue descrever e a única coisa que se quer é deitar. Deitar mesmo que a cama e o quarto estejam uma bagunça infinita, encolher-se em posição fetal e esquecer que o mundo existe.
Não há explicação para isso, especialmente quando se sabe que admitir isso é, para muitos, admitir que perdeu. É, também e pior que tudo, encarar olhares de pena ou de espanto, como se existisse uma certa proibição de falhar.
Isso é tudo de que uma pessoa deprimida não precisa. Então, não olhe com dó, como se a pessoa fosse quebrar. Ela já está, de alguma maneira, quebrada. Ela precisa se emendar e sentimentos de pena só pioram. Ela precisa ser resgatada de si mesma, fortalecida, não ignorada.
No geral, é como se a pessoa tivesse que chegar para o mundo e dizer: Perdi!
A descoberta desse estado de tristeza é aterradora e encarar pode doer mais por não acreditar que está ocorrendo consigo do que realmente pela gravidade da coisa. A primeira coisa que dizemos a nós é: Não pode ser! Comigo, não!
Quanto a mim, Eu estou triste... mas NÃO, EU NÃO PERDI! Eu só estou triste. Não estou frustrada, não estou infeliz, estou triste apenas. Cansada, talvez... . Estou triste de uma tristeza que por agora, me impede de ter a segurança de antes.
Sei que muitos também estão assim, mas por algum motivo, têm medo ou vergonha de falar. No entanto, é preciso coragem de admitir, de ter paciência consigo mesmo(a), de pedir ajuda, de conversar, de aceitar que está triste e inseguro(a) para então descobrir o caminho de volta a si, à própria essência. Contudo, não é o fim do mundo; não é o fim da vida, é só um degrau um pouco mais forçoso de subir.
Desculpem, meus amigos, porque, nesse processo, a gente muda... eu posso estar falando mais alto que o normal, eu posso estar puxando conversa de mais, eu posso não estar respondendo às mensagens como antes ou estar respondendo mais que o normal, eu posso atrasar os compromissos do trabalho além do normal (não é falta de compromisso)... Observem os sinais. Você mesmo(a)  ou alguém bem perto de você, pode estar precisando de ajuda. 
Observem os sinais!


A poesia de ser

A dicotomia poesia-poema nunca me pareceu suficientemente explicada nas academias. Sempre faltou algo no tocante à poesia e, por extensão, ao poeta. Descobri, numa tarde, enquanto ministrava aula de literatura e falava sobre Drummond, que os poetas sentem o mundo com o coração mais dolorido. Os poetas sofrem mais. Sofrem porque percebem o imperceptível aos olhos normais. Talvez, por isso mesmo, os poetas sejam vistos como loucos ou, pelo menos, não muito "normais".
Ser poeta é sentir. Só isso basta. 
Sentir o mundo.
Sentir as pessoas.
Sentir a si mesmo.
Sentir...
O poeta não vê números na guerra, vê vidas que se perdem, sente a dor, chora essa dor. O poeta ama... Fazer poesia é amar o outro e quando ama de paixão, transforma o ser amado em paisagem, possível de ser admirada por uma vida inteira sem cansar da imagem e tudo isso, mesmo vislumbrando um precipício logo adiante. O sentir é o que importa. Quem descobre a poesia de ser descobre que o Amor é a única essência, é a mais bela imagem, que pessoas podem ser paisagens vivas a se movimentar e seguir.
Fazer poesia é ser ridículo, como as ridículas cartas de amor referenciadas por Pessoa. Por isso, o poeta não vive, apenas, ele/ela sente o mundo, sente as pessoas do mundo. 
Esse sentir silencioso, pouco compreendido, desperdiçado dispensa explicações. Apenas É.
Ah... Bem-aventurados os poetas e poetisas do mundo, que vivem a desventura gratuita de não serem compreendidos, de não serem amados, de não serem admirados e, ainda assim, continuarem sendo quem são.
Bem-aventurados os que veem o Amor e a Poesia em tudo: na flor que desabrocha;
Na criança que nasce;
Num animalzinho de rua;
No envelhecer de cada dia;
Numa palavra de gratidão ou num pedido de ajuda;
Na alma que se liberta e vai morar nas estrelas...
Bem-aventurados os que sabem ser a poesia lida, os que se tornam poesia mesmo sem saber... Bem-aventurados os que inspiram a poesia e se tornam paisagem aos olhos dos corações que poetizam...
Bem-aventurados os que livremente se permitem "prender", por puro querer, por puro sentir...