Fragmentos de mim: outubro 2015

quinta-feira, 15 de outubro de 2015

Sobre mapas e arrepios

A quem é dado o poder de desenhar a alma alheia? A quem é dado o direito de traçar mapas da alma do outro? A ninguém. Sentimentos e pensamentos são terrenos particulares demais para permitir que alguém os conheça a fundo. E não falo aqui de falta de amor... Afinal, seja a falta, seja a sobra do amor, a ninguém mais interessa senão a quem o sente. 

A quem interessa se ardo de paixão ou mofo de solidão? Se morro de amores ou, simplesmente, sou indiferente? E é esse mistério que faz das pessoas interessantes. Não teria a menor graça não mudar, ter desnudada a alma para qualquer um conhecer. Os misteriosos me fascinam e a eles dedico horas e horas de pensamentos - para não dizer, devaneios... E absinto-me dos arrepios que me causam a simples possibilidade da aproximação. Há pessoas marcantes demais para não serem conhecidas, desnudadas, exploradas...

A quem interessa que eu não mude? Quem ganharia com isso? Que importa? Importa que trago uma alma repleta demais de sensações as mais diversas e fortes para me calar. Importa que o desejo me move e me faz agir como se estivesse completamente embriagada. E quem disse que não estou embriagada? Embriagada pela curiosidade de conhecer quem tem o olhar cheio de mistérios, a quem a recordação do nome me arrepia... Embriagada pela obrigação de conter um toque. Ah, o toque... Incrível como somos, fantástico como somos. O toque... não se trata da intensidade física, mas da intensidade da sensação que provoca o ser a quem se quer tocar... Pior é não poder tocar e a falta de possibilidade do toque intensifica a vontade, que se agarra à mente e se configura em tentação que me consome cada segundo de pensamento...

A quem é dado o direito de construir mapas da alma alheia? A mim é que não deram e não adiantaria nada, pois sou desorientada por natureza e mapas fazem com que me perca ainda mais. Mas eu quero me perder sem mapas, sem bússolas, sem possibilidade alguma de me encontrar de novo no estado de "sem ter quem eu quero", no estado de "não ter de quem necessito" e a mera recordação me faz arrepiar a pele e correr aquele frio quente via coluna que chega a enfraquecer as pernas... quero me perder no terreno do corpo que me desperta sensações que palavra alguma descreve.

E essa proximidade distante me enlouquece. A quem é dado o direito de desenhar alma alheia?A mim é que não deram!! A quem é dado o direito de querer e querer e querer?... A mim me deram e eu quero, quero e quero... e me arrepio e me embriago, mas a impossibilidade do toque... ah, o toque... só de imaginá-lo me atiça até alma. E eu quero me perder sem mapas, embriagada das sensações que até a recordação do teu nome me provoca... sem mapas... o toque... arrepios... devaneios de desejos de te ter...


segunda-feira, 12 de outubro de 2015

Sobre ser criança...

12 de outubro, dia das crianças... Errando pela terceira vez a digitação da palavra. Incrível, nunca digito a palavra "criança" sem errar... Bem, mas esse não é o assunto da crônica. Hoje, especialmente, estou com uma vontade louca de escrever. Há dias essa vontade me persegue e volta e meia, lembro-me de que, num passado não tão distante, eu escrevia bastante e afirmava com a alma que escrevia para me manter viva. Mas há tempos não escrevo e, coincidentemente ou não, há tempos sinto que não tenho vivido, apenas respirado.

Como sempre, hoje o dia é marcado pelas mensagens, brincadeiras, e os compartilhamentos de frases reflexivas sobre não deixar morrer a criança que um dia existiu em cada um... e blá, blá, blá... é... eu também compartilhei mensagens com isso hoje e o fiz com sinceridade. Embora esteja longe de mim querer voltar a ser criança, não.... não com a infância que tive. Não foi das piores, mas está longe de ter sido boa, tanto que não desejo a ninguém ter sido criança como fui. 

O pior é saber que as frases clichês têm toda razão. Não deixamos de ser crianças nunca. O corpo envelhece, engorda, enruga, prova milhares de sensações diferentes que, em infância geralmente não provamos porque nos protegem, dada a nossa condição física frágil e semelhante a um ser angelical - ao menos na caracterização folclórica e/ou religiosa da coisa. Acham-nos inaptos ao trabalho, ao sexo, às drogas milhares que existem. E de fato, somos. Que bom que nos protegem.

O que é fato também é que o passar dos anos não torna todos capazes de viver tudo isso, ou ao menos parte de tudo isso, sem adoecer, sem morrer em algum sentido. Não são todos que suportam as drogas, são muitos os que fazem sexo e se desconhecem em sua própria sexualidade, e são todos, todos os que morrem de medo de alguma coisa. O corpo muda, mas a criança é a mesma, só que sem o aspecto de anjo. O anjo se transforma em espectro quando nos tornamos incapazes de admitir nossa criança, nossos anjos e nossos demônios, que já nascem conosco, mas os adultos não enxergam. Além disso, quem disse que quando adultos deixamos de temer os fantasmas? Quem disse que nos tornamos seguros? O que o passar dos anos faz é nos tornar um pouco mais hipócritas a cada dia, não menos doentes ou temerosos. E o pior disso tudo é que nossa máscara de adulto nos torna solitários demais para assumirmos quem somos e aí sim, a coisa piora, pois além de morrermos de medo dos fantasmas, morremos também de medo de assumi-los e de pedir ajuda.

Que se dane a inocência!! Não estou escrevendo esse texto para falar dela. Ela, sim, foi embora com o passar dos anos. Ainda que não por completo, o passar dos tempos nos tira a inocência. E que bom. Detestaria ser cega a vida inteira. O problema é que alguns adultos não querem assumir isso e, por essa razão criam a ilusão de inocência. Essa, travestida de candura, ajuda as pessoas a se tornarem imbecis por opção, a tentar enxergar um mundo que não existe só para não terem de passar pela frustração de encarar de frente um mundo que não é como ela queria que fosse. Isso é péssimo. Torna as pessoas vítimas, mas não dos outros, vítimas de seus próprios fantasmas, vítimas de suas hipocrisias mais cruéis e limitadoras às quais, por pura fraqueza, damos o nome de inocência. 

Nisso sinto inveja das crianças. Elas não têm medo da verdade. Elas querem a verdade, buscam-na, perguntam cara a cara, olho no olho: "O que é isso?" "Por quê?" E são tantas as perguntas que nossa limitação de gente que esqueceu que nunca se deixa de ser criança não tem paciência para responder. Por isso, lamentavelmente, ensinamos às crianças a serem como nós. Damos a elas respostas idiotas que, de tanto serem repetidas, elas acabam acreditando. Ensinamos às crianças a terem medo de crescer, a se conformarem com mentiras só porque vai doer menos, a mergulharem na ilusão, a acreditarem que existem pessoas mais importantes que as outras, a agirem por meros interesses, a preservarem a "inocência" e tiramos delas o que de mais precioso possuem: a capacidade única de buscarem a verdade.