Fragmentos de mim: Papo sério

segunda-feira, 11 de fevereiro de 2019

Papo sério

"Nossa, você ainda está solteira? Ninguém mais vai te querer! Está velha!" "Mulher que se respeita não transa no primeiro encontro". "Mulher que se valoriza tem pudores na cama". "Mulher boa de cama não serve para casar"... O moralismo castrador travestido de respeito e valores transformou a mulher retraída e infeliz num modelo ideal de santidade. Ora, tudo gira em torno do sexo, da sexualidade e da maneira como se vive e administra isso. 
Pela sexualidade inclui-se ou exclui-se alguém. E no caso da mulher, define o caráter. Tanto homens quanto as próprias mulheres agem assim e, em nome desse agir, as mulheres mutilam-se, castram-se, deixam-se morrer.
Já vi mulher odiando mulher por julgá-la ser mais bonita. (Eu mesma já fiz isso), já vi mulher afastar-se de outra com medo de ser alvo de uma cantada, porque acha que o fato de uma mulher ser homossexual vai fazer com que ela queira pegar todas. Já vi homem desprezar uma mulher apaixonada por ela ser bissexual e ele ter medo de ser trocado por outra ou não confiar no sentimento dela...
Todos vemos todos os dias mulheres sendo alvo de agressões e abusos os mais diversos por não saberem como sair de uma relação abusiva, por medo de ser mais vítima ainda das acusações e perseguições, sejam do companheiro, sejam da sociedade.
Vivemos em uma cultura que nos ensina a competir como se fôssemos inimigas a disputar um espaço de sobrevivência. No entanto, viver mesmo é dar as mãos, apoiar as pessoas, amar as pessoas por serem pessoas, irmãs de espécie, por terem alma, por estarem vivas. É a causa humana que está em jogo. Detestar e competir com uma mulher por ela ser mais bonita não vai agredir a beleza dela, só vai tornar doente a alma de quem o fizer. Há pessoas mais tímidas, outras nem tanto, mas quem somos nós para julgar?
Que é necessário estarmos vigilantes quanto à maledicência - alheia e nossa mesmo - é indiscutível, mas isso não deveria ser motivos de haver guerras entre pessoas que, submetidas a um rótulo, passam a ter invisibilizados e desvalorizados os seus sentimentos. O resultado disso tudo é estarmos cercados de pessoas, mas continuarmos profundamente sozinhos e sozinhas.
É rejeitarmos o amor de alguém porque, em algum momento, aprendemos que a pessoa não merece nosso amor, ou que ela é capaz de suportar qualquer coisa. Não, ninguém é tão forte assim. Eu não preciso competir com a beleza e a juventude de outra, preciso cuidar da minha; Eu não preciso me submeter a uma relação que me faça sofrer só para não estar sozinha; Nenhuma mulher precisa temer a aproximação de uma mulher lésbica, porque, a menos que ela seja louca, não vai sair agarrando qualquer uma por aí. Os homens não precisam temer - nem deveriam desprezar - o amor de uma mulher bissexual, porque, se ela está apaixonada, não tem por que pensar em ninguém mais senão no motivo de sua paixão. E por mais ridículo que seja, é preciso ressaltar que os sentimentos dela podem ser puros.
Falta-nos segurança sobre nós mesmos(as), falta autoamor e enquanto for assim, vai faltar amor ao próximo. Precisamos nos olhar no espelho e declarar amor para nós mesmos(as). Precisamos parar de nos agredir e de permitir que nos façam isso. Há machismo de mais no mundo, há sororidade de menos. E enquanto isso, todas as pessoas e, em especial, nós, as mulheres, continuamos sendo agredidas, violentadas, pelos outros, entre nós mesmas e por nós mesmas. Seria justo isso?

2 comentários:

  1. Que texto lindo, Gorete! Tão autêntico e verdadeiro. Eu não poderia passar por esse mundo sem essa leitura. Obrigada! Parabéns!

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